Cursar Jornalismo: algumas observações que você deve considerar
Foto: Dimitri Houtteman — Unsplash
Levando em conta que já postei algumas reportagens, artigos e entrevistas, suponho que saibam que estudo Jornalismo. Particularmente, acho que foi um grande erro ter entrado nessa furada, e pretendo concluir minha graduação apenas porque já estou na “metade do caminho” e gastei uma quantidade significativa de dinheiro com mensalidades, transporte e materiais.
Além disso, após uma pesquisa, reparei que a grande maioria do conteúdo disponível na internet sobre o assunto aponta somente benefícios e outras características positivas sobre cursar jornalismo. No entanto, dificilmente algum interessado irá encontrar um artigo que também destaque as desvantagens de tal profissão. Sendo assim, gostaria de mencionar algumas informações importantes que você deveria considerar antes de optar pela graduação.
Afinal, por que escolhi esse curso?
Com total sinceridade e sendo o mais direto possível: por mera questão de desespero, falta de convicção sobre questões na qual sempre carreguei e inconsequência juvenil.
Desde que completei o ensino médio, sempre li matérias afirmando que “curso superior não era garantia de absolutamente nada”, “qualquer graduação que não fosse medicina no Brasil era perca de tempo e dinheiro”, “a maioria dos graduados sequer chegavam a atuar na área de formação, adquiriam dívidas com financiamentos estudantis e apenas acabavam agravando sua situação de vulnerabilidade social” etc.
No entanto, quando cogitei procurar alguma formação superior, eu já estava com 22 anos, trabalhando como assistente de contabilidade, ganhando um pouco mais de um salário mínimo e me sentindo como se fosse o maior fracassado da face da terra devido minha “condição de subempregado” e dependência financeira.
Logo, acabei sendo influenciado por diversos comentários de senso comum, entre eles: “você não irá cursar medicina mesmo, então procura outra coisa”, “vai acabar virando um “quarentão” ganhando salário mínimo se não concluir um curso superior” e similares.
Então, analisei a situação e, por perceber que gostava de escrever (sempre fiz resenhas de shows, livros, entrevistas com bandas e dava certos palpites sobre política, história e economia), acabei optando pelo curso de jornalismo. Além disso, alguns testes vocacionais online indicavam que esse era o caminho certo para mim.
Sendo assim, por que me arrependo de ter escolhido a carreira jornalística?
Porque esse curso é um passaporte para uma vida profissional repleta de insegurança, pressões e salários baixos. Existem diversos fatores que explicam este fenômeno, na qual tentarei explicar nos tópicos a seguir:
Popularização do ensino superior
A explicação começa com a popularização do ensino superior. Hoje em dia, em praticamente todos os municípios do país, existem diversas universidades privadas. Geralmente, são faculdades sem renome, compostas por professores desqualificados e alunos de fraca base escolar. Universidades que, na maioria das vezes, fornecem ensino de baixa qualidade, pois essas instituições não estão interessadas com o bem estar e o desenvolvimento do aluno, mas sim com faturamento no mercado da educação — inclusive, um estudo feito pela Times Higher Education (THE) demonstra que o Brasil sedia as piores instituições de ensino superior privado da América Latina.
Essas faculdades são compostas por pessoas que sequer deveriam ter curso superior, já que praticamente todos os empregos da economia de um país estão nas áreas de comércio, indústria, agricultura e serviços. Logo, não há espaço, demanda ou justificativa para todos terem um diploma universitário, resultando em um mercado inflado e em maior competitividade.
Baixa renda da população brasileira
Infelizmente, o Brasil ainda é muito pobre. Segundo as próprias estatísticas do governo, 50 milhões de pessoas em nosso país vivem abaixo da linha da pobreza e 80% da população economicamente ativa trabalha apenas para pagar por alimentação e outras necessidades de primeira urgência (eletricidade, aluguel, internet etc).
Consequentemente, a grande maioria dos brasileiros não possui poder aquisitivo para usufruir de produtos e serviços realizados por trabalhadores com mão de obra especializada. Isso reduz as oportunidades de trabalho e a geração de empregos para o setor de comunicação, pois boa parte da população não tem renda para assinar revistas, contratar canais fechados com conteúdos exclusivos e redes de transmissão via streaming — ou seja: campos cruciais para atuação dos jornalistas.
Ausência de matérias exatas em sua grade curricular
Outro fator crucial para que haja um grande fluxo de pessoas cursando jornalismo (e, obviamente, resultando em grande competição no mercado de trabalho) é a falta de matérias exatas em sua grade curricular.
Assim sendo, muitos se voltam ao jornalismo, já que boa parte das atividades do curso demandam apenas leitura, escrita e certos conhecimentos sobre gadgets e softwares de edição.
Perseguição contra determinadas posições ideológicas dentro da área
Infelizmente, não há espaço democrático para discussões dentro do curso de jornalismo. Hoje em dia, pensamentos alinhados a movimentos de esquerda são simplesmente dominantes.
Desde o primeiro semestre, professores enviesados tentam impor certas posições ideológicas de esquerda, e tais pensamentos repercutem entre os alunos ao longo de todo o curso. Assim sendo, abordar questões como liberalismo econômico, redução do estado, flexibilização de leis trabalhistas, incentivo ao empreendedorismo e mostra-se a favor de tais pautas é praticamente um crime. O aluno que tiver um pensamento mais voltado a direita liberal e queira discutir racionalmente sobre certas vantagens da economia de livre mercado certamente será perseguido, perdendo diversas oportunidades e ofertas para ingressar no mercado de trabalho.
Extinção da obrigatoriedade do diploma para exercer a profissão
No dia 17 de junho de 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) atendeu a um recurso idealizado pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo (Sertesp) e pelo Ministério Público Federal (MPF), que pedia a extinção da obrigatoriedade do diploma para a profissão de jornalista.
Sendo assim, concluir a graduação já não é algo obrigatório, e qualquer um pode atuar como jornalista.
Devido a tal medida, não há mais necessidade de passar quatro anos estudando temas como sociologia, teoria da comunicação e ética da profissão. Qualquer um com certos conhecimentos sobre economia, história, esportes ou política pode simplesmente abrir uma conta na plataforma Youtube™, divulgar opiniões pessoais e já ser considerado “jornalista”.
Infelizmente, tal medida tira vagas de pessoas que realmente se dedicaram durante anos para obter uma formação, além de resultar em um jornalismo de péssima qualidade.
Mudanças estruturais
Nos últimos anos, o mercado de jornalismo mudou muito (e, certamente, irá continuar mudando). Devido às transformações trazidas pela internet, os portais tradicionais de comunicação estão realizando cortes massivos em seus quadros de funcionários.
Nos últimos 5 anos, muitos profissionais com décadas de experiência foram demitidos, e os grandes veículos de mídia estão reduzindo o número de pessoas em suas redações a cada dia que passa. Desta forma, a maior parte dos profissionais formados em jornalismo estão sendo absolvidos por empresas — caso deste que vos escreve — para realizar trabalhos de assessoria de imprensa.
Logo, as possibilidades clássicas (ex: repórter de TV, locutor de rádio ou redator de jornal impresso) se tornaram praticamente inexistentes.
Baixa remuneração
Por último, um aspecto nada positivo da área de jornalismo é a baixa remuneração oferecida aos trabalhadores que atuam na profissão.
Infelizmente, esse é uma ocupação extremamente mal paga, e todos que pensam em cursar essa graduação devem ter isso em mente. Não quero desanimar ninguém e não estou dizendo que isso é completamente impossível, porém, dificilmente um formado que atua diretamente com produção jornalística terá uma renda superior a R$5.000,00, e apenas colaboradores de grandes portais conseguem alcançar uma remuneração superior a este valor. Atualmente, a média salarial de um jornalista no Brasil é de R$2.841,33.
Arrependo-me de ter cursado jornalismo?
Certamente, o curso de jornalismo trouxe certos conhecimentos e me fez crescer muito como pessoa. Além disso, consegui sair do subemprego, sou estagiário em uma pequena empresa internacional de investimentos e administração de ETF (Exchange Traded Funds), e tal experiência me forneceu a oportunidade de conhecer o mundo do mercado de aplicações em renda variável.
No entanto, quando analiso os baixos salários, as oportunidades minguadas, as perseguições ideológicas e penso no dinheiro investido ao longo da graduação, chego a conclusão de que não foi uma boa escolha (e, certamente, não recomendaria tal profissão a ninguém). Após concluir o curso, pretendo seguir os estudos em algo relacionado ao mercado financeiro.
Devo cursar jornalismo?
Sinceramente, ao analisar o mercado como um todo, não acho que seja uma boa ideia. Caso tenha talento e plenas convicções de que essa profissão se enquadra ao seu objetivo de vida, siga em frente!
Se realmente deseja entrar neste barco furado, recomendo que estude em uma universidade pública de renome ou tente conseguir uma bolsa em alguma instituição privada com alta avaliação do MEC. No entanto, jamais solicite um financiamento estudantil. Além disso, tenha um “plano B” e estude para concursos públicos, faça um curso técnico e domine pelo menos dois idiomas estrangeiros. Infelizmente, o futuro do mercado de comunicação no Brasil é totalmente incerto, e colocar todas as fichas nesta graduação é algo totalmente irracional.