Dark Dimensions apresenta seu primeiro festival e destaca força feminina no metal nacional
Fotos: Carlos Pupo — Headbangers News
Formada no início dos anos 2000 pelo empresário Marcos Langsuyar, a Dark Dimensions, uma das mais renomadas produtoras do cenário underground nacional, já trouxe ao Brasil grandes nomes do rock e do metal extremo, como Rob Halford, Skid Row, Cradle of Filth, Arch Enemy, Dark Tranquillity, Deathstars, The Agonist, Apocalyptica, The Mission e muitos outros.
Apesar de seu prestígio no universo do rock brasileiro, a produtora ainda não havia realizado um festival próprio. No entanto, essa espera chegou ao fim com um marco importante em sua trajetória.
No último sábado (25), no feriado de aniversário da cidade de São Paulo, aconteceu o inédito Dark Dimension Fest, no tradicional Carioca Club. O evento apresentou um lineup poderoso, com destaque para bandas lideradas por vocalistas mulheres, como The Damnation, Eskröta, Torture Squad e Nervosa — esta última como headliner da noite. Além disso, o festival contou com apresentações de Thrown To The Wolves e da banda australiana Elm Street.
- Evento
Por volta das 14h, o clube abriu suas portas para o público geral. Durante a primeira hora, os presentes puderam explorar algumas atividades secundárias montadas na pista, como um espaço para tatuagens e um estande com brincos, anéis e outros acessórios voltados ao público headbanger.
Com alguns minutos de atraso, a banda The Damnation deu início à celebração. Formado em São Paulo, o trio de garotas — liderado pela guitarrista e vocalista Renata Petrelli, ex-integrante da banda SINAYA — apresentou um som com fortes influências de death metal old school. A sonoridade violenta trouxe batidas pesadas, um instrumental cru e vocais guturais em músicas como “Parasite” e “World’s Curse”. Apesar de algumas passagens soarem ligeiramente fora de ritmo e desafinadas, o grupo conseguiu transmitir uma energia autêntica e intensa. Ao longo do repertório, também ficou evidente a influência de stoner rock em suas composições, adicionando uma camada única ao som.
Perto do encerramento, a frontwoman Renata destacou a força feminina presente no evento, um momento que foi aplaudido pelo público. Antes de seguir para reta final com “Slaves Of Society”, ela comentou sobre as chuvas do dia anterior, dedicando a música ao proletariado que enfrenta essas adversidades diariamente.
Indo na contramão da sonoridade mais simples e crua do The Damnation, veio Throw Me To The Wolves, uma banda nova na cena, mas formada por figuras já conhecidas, como Gui Calegari (ex-Venomous) e Maycon Avelino (videomaker e diretor de videoclipes).
O grupo apresentou um death metal melódico extremamente técnico, repleto de riffs cativantes e bem elaborados. Faixas como “Fragment” e “Gaia”, que integrarão o primeiro álbum completo previsto para breve, destacaram o domínio técnico e criativo dos músicos, com influências modernas de metalcore adicionando um toque de inovação ao som. O vocalista Diogo Nunes foi um dos grandes destaques, esbanjando confiança e presença de palco ao longo do set, como se estivesse à frente da banda há anos. Sem dúvida, o Throw Me To The Wolves impressionou com uma maturidade notável para um grupo estreante, demonstrando o alto nível de comprometimento de seus integrantes com o projeto.
Na sequência, chegou a vez de um dos nomes mais aguardados do evento: Eskröta . Formado no interior de São Paulo em 2017, o trio rapidamente se consolidou como um dos maiores representantes do thrash metal nacional, com destaque suficiente para garantir sua participação na edição de 2024 do Knotfest.
Desde o início do festival, o entusiasmo do público pelo grupo era evidente, com inúmeros fãs ostentando camisetas da banda. E essa expectativa foi plenamente justificada. Durante o set, músicas baseadas no instrumental crossover como “Eticamente Questionável”, “Mosh Feminista” e “Homem é Assim Mesmo”, marcadas por blast beats intensos e riffs afiados, incendiaram a plateia, que transformou o mosh pit em uma verdadeira zona de guerra. Em meio à energia vibrante, balões personalizados com o logo da banda cruzavam o espaço, criando uma “batalha” harmoniosa e repleta de animação.
Um dos momentos mais inusitados da apresentação ocorreu durante “Não Entre em Pânico”, quando um fã vestido como Ghostface, da franquia de filmes de terror Pânico, subiu ao palco, interagiu com os integrantes e logo se jogou na multidão para participar de um wall of death. Antes do encerramento, a baixista Tamy Leopoldo revelou que um novo álbum completo está a caminho, arrancando uma onda de aplausos e gritos de empolgação. Sem dúvidas, o show do Eskröta foi um dos pontos altos do evento, marcado pela interação vibrante com o público e pela energia contagiante que tomou conta do palco e da plateia.
O festival também contou com uma atração internacional. Diretamente de Melbourne, Austrália, Elm Street, banda formada em 2008, trouxe ao palco uma mistura de speed metal, thrash e heavy metal tradicional. Durante o setlist, o grupo revisitou várias fases de sua carreira, mas deu destaque especial às músicas de seu mais recente álbum, The Great Tribulation, lançado em 2023.
Os guitarristas Aaron Adie e Ben Batres mostraram uma química impecável, executando riffs complexos e solos ágeis com precisão técnica. Além de seu papel na guitarra, Ben também assumiu os vocais, conduzindo o público com carisma. Mesmo aqueles que não conheciam bem o trabalho do conjunto se deixaram levar pela energia, acompanhando animadamente nos coros e nas palmas sempre que solicitados pelo frontman. Em um momento especialmente pensado para agradar os brasileiros, famosos por sua paixão por Iron Maiden, a banda mandou um cover de “Running Free”. Apesar de se apoiar em alguns clichês típicos do heavy metal e ter um som extremamente genérico, o Elm Street fez uma apresentação capaz de agradar.
Caminhando para a reta final do evento, o Torture Squad subiu ao palco com alguns minutos de atraso, possivelmente devido a problemas técnicos. Contudo, qualquer inconveniente foi rapidamente esquecido graças ao cuidado com a ambientação: bandeiras decoravam o cenário, uma iluminação intensa destacava o palco, e projeções de artes do grupo eram exibidas em um telão de LED, criando uma atmosfera visual marcante. O show começou com uma sessão intensa de Devilish, o álbum mais recente da banda, lançado em 2023, incluindo as faixas “Hell Is Coming”, “Flukeman” e “Buried Alive”. A plateia foi imediatamente arrebatada por uma onda de brutalidade sonora, com blast beats precisos, riffs avassaladores e os guturais ferozes da vocalista Mayara Puertas. Passagens inesperadas com violões trouxeram um contraste interessante, que se encaixou surpreendentemente bem na sonoridade death metal.
Na sequência, Mayara fez uma pausa para um emocionante discurso em homenagem ao ex-integrante e fundador Cristiano Fusco, falecido no início do mês em decorrência de um câncer. Comovendo o público, a banda dedicou a ele “Abduction Was the Case”, do clássico álbum The Unholy Spell (2001).
O setlist seguiu com uma seleção poderosa de músicas já conhecidas, como “Raise Your Horns”, “Murder of a God” e “Pull the Trigger”. A grande surpresa da noite foi a participação especial da vocalista Leather Leone no single “Warrior”, uma música de pegada mais próxima do heavy metal tradicional, destoando do estilo característico do Torture Squad, mas agradando pela inovação. A banda entregou uma performance brutal, enérgica e visualmente impecável, digna de um show de headline.
Para encerrar o primeiro Dark Dimensions Fest com chave de ouro e com a casa completamente lotada, foi a vez da banda Nervosa tomar o palco, após um atraso de mais de 30 minutos. O show teve um significado especial por dois motivos: além de marcar o início das atividades do grupo em 2025, celebrou o aniversário de 15 anos da banda. Apesar de ser o headliner, o cenário foi mais simples em comparação ao Torture Squad, com apenas uma bandeira decorando o fundo. O setlist abriu com “Seed of Death”, “Behind the Wall” e “Death!” — esta última precedida por um discurso da vocalista Prika Amaral sobre a importância de não permitir que atitudes opressoras limitem as mulheres. Desde os primeiros acordes, os fãs responderam com mosh pits gigantes na pista, enquanto Prika comandava os coros de “hey, hey”, elevando ainda mais a energia do público. Antes de “Kill the Silence”, a vocalista aproveitou para explicar a ausência da baixista Hel Pyre, que ficou de fora do show por ter se tornado mãe recentemente. Prika reforçou seu compromisso com a igualdade, afirmando que “não iria tirar a oportunidade de uma mulher por agora ser mãe ou devido à gestação”.
No meio da apresentação, o público foi presentado com participações especiais: Alex Camargo, do Krisiun, subiu ao palco em “Ungrateful”, enquanto Mayara Puertas e Yasmin Amaral dividiram os vocais em “Cultura do Estupro”. Logo após, a energia seguiu em “Hostages”, “Kill or Die”, “Into Moshpit”, “Jailbreak” e “Endless Ambition”, fechando a noite. Nervosa entregou um set de 19 músicas, totalizando mais de uma hora no palco do Carioca Club, fazendo desta uma das apresentações mais longas de sua carreira.
Com isso, o primeiro Dark Dimensions Fest provou ser um evento que prezou pela música pesada com extremo cuidado. Apesar de alguns atrasos que impactaram ligeiramente a experiência geral, o problema não chegou a ser um grande incômodo, mas serve como um ponto de melhoria para futuras edições. Que essa marca importante para o metal continue crescendo e consolidando sua relevância no cenário musical.